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O que há de novo?

Avanços na carreira do EBTT: de professores de 1ª e 2º graus à equiparação com o Magistério Superior.

Prof. Nilton F. Brandão,
vice-presidente do PROIFES-Federação

Na contramão da conjuntura internacional na virada de 2012 para 2013, caracterizada por incertezas, instabilidade e enorme insegurança para a grande maioria dos trabalhadores em todo o mundo, os docentes das Instituições Federais de Ensino Superior encerraram o ano de 2012 colocando à prova a capacidade de luta, mobilização e negociação da categoria, tendo o acordo assinado pelo PROIFES-Federação transformado em Lei no final do mês de dezembro daquele ano.


A Lei nº 12.772, de 28 de dezembro de 2012, sancionada sem vetos pela presidente da República, Dilma Rousseff, dispõe, entre outros fatores, sobre a estruturação do Plano de Carreiras e Cargos de Magistério Federal; sobre a Carreira do Magistério Superior (de que trata a Lei nº 7.596, de 10/04/87; sobre o Plano de Carreira e Cargos de Magistério do Ensino Básico Técnico e Tecnológico (EBTT) e sobre o Plano de Carreiras de Magistério do Ensino Básico Federal (de que trata a Lei nº 11.784, de 22/09/2008). 1


Em especial tratamos aqui do Reconhecimento de Saberes e Competências, proposta que procura dar novo significado à história de vida dos professores que dedicaram suas vidas ao Ensino Técnico e Tecnológico. Entretanto, apesar de dedicação reconhecida, não tinham uma carreira com estrutura adequada nem incentivos para serem valorizados. Porém, dada a importância dos avanços obtidos nesta negociação, é importante registrar outras conquistas que são especiais para o EBTT.


Além dos reajustes acumulados de 25% a 44% até 2015 – garantindo reajuste mínimo de 13% para os professores das Universidades e Institutos Federais a partir de 1º de março de 2013 – também entraram em vigor as novas regras das Carreiras: o acordo consolida em lei a equivalência salarial e estrutural entre os professores do magistério federal (MS e EBBT). Trata-se da consolidação de uma conquista histórica do acordo de 2008 assinado pelo PROIFES (Lei 11.784) que criou a carreira do Ensino Básico Técnico e Tecnológico que aproximou as carreiras, mas ainda com algumas diferenças e sem garantias legais para as conquistas obtidas.

Das conquistas obtidas não é de menor significado o resgate da possibilidade de promoção acelerada na carreira. Como se sabe, a Lei 11.784/2008, como todas as revisões feitas após a constituição de 1988, não permitia tal benefício. Esta possibilidade, ainda em prática à época das negociações no MS, estava ameaçada pela decisão do Supremo Tribunal Federal (ADIN 231-7 de 1992). Além disso, apenas um reduzido número de instituições federais permitia tal promoção mediante acordo dos Sindicatos com as reitorias (caso do IFPR) ou mediante decisão judiciais. Estima-se que este benefício era aplicado para apenas 10% dos professores do EBTT em todo o Brasil. Inteligentemente o PROIFES conseguiu manter o crescimento rápido na carreira, superando a ADIN 231-7, com consequente retribuição salarial, para o MS e ainda recolocou o benefício para todos os professores do EBTT.


Analisemos então o Reconhecimento de Saberes e Competências (RSC), uma inovação importante para os docentes de EBTT. Conforme regulamentado pelo Conselho Permanente de Reconhecimento de Saberes e Competências (CPRSC), instituído pela Portaria do MEC nº 491 de 2013, o benefício será concedido em três níveis: a obtenção da RT de especialista para docentes apenas com graduação (RSC-I); a RT de mestre para docentes com o título de especialistas (RSC-II); e a RT de doutor para docentes com o título de mestres (RSC-III).


A proposta surgiu da convergência de duas conclusões: a primeira de que estava sendo oferecido aos professores do EBTT uma carreira estruturada a partir do Acordo assinado e da conversão deste acordo em Lei (Lei 12.772/2012); carreira motivadora e que proporciona as condições para dedicação ao ensino, à pesquisa e à extensão, características ausentes na carreira anterior; a segunda, corolário das condições ditas antes, a ausência de incentivos para que os professores até então na rede federal (Escolas Técnicas e CEFETs), em especial os mais antigos, pudessem buscar qualificação (especializações, mestrados e doutorados) condição necessária para usufruir os benefícios da nova carreira. Assim, seria necessário a viabilização de alternativas que pudessem garantir os benefícios obtidos também para os professores que praticamente já tinham uma vida dedicada ao ensino e à sociedade brasileira.


Uma vez caracterizado o novo perfil da carreira que entraria em vigor, era necessário também analisar o perfil da nova realidade do ensino técnico e tecnológico no país. Afinal, se fosse apenas para resgatar a falta de incentivos histórico, o RSC poderia ser definido dentro de um espaço limitado de tempo, pelos 5 próximos anos, por exemplo. O que justificaria a manutenção de tal benefício como uma conquista atemporal, também acessível àqueles recém entrados na carreira ou que ainda entrarão no futuro?


Para responder ao novo questionamento foi necessária uma análise das modificações ocorridas no cenário educacional do País nos últimos 10 anos.


Junto com a expansão das universidades, programas federais também fizeram fortes investimentos voltados para o ensino médio, técnico e profissional. Não se trata de análise para o momento, mas um relato rápido dá a dimensão desta nova realidade: a Rede Federal de Educação profissional, científica e tecnológica, com 19 Escolas de Aprendizes e Artífices (criadas em 1909) contava com 140 escolas em 2002. Em 2010 eram mais de 350 e em 2014 chegam a 562 unidades. 2

Não se trata só de uma expansão física, mas de um novo modelo educacional. A carreira do EBTT contempla um conjunto de instituições presentes em realidades amplamente diversas em todo o território nacional. Além dos Centros Federais de Educação Tecnológica (CEFETs), das Escolas Técnicas Vinculadas às Universidades Federais, o sistema ganhou a Universidade Tecnológica Federal do Paraná (transformação do CEFET-PR) e os novos Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia, “instituições de educação superior, básica e profissional, pluricurriculares e multicampi, especializados na oferta de educação profissional e tecnológica nas diferentes modalidades de ensino” que “para efeito da incidência das disposições que regem a regulação, avaliação e supervisão das instituições e dos cursos de educação superior, …são equiparados às universidades federais”. 3


Evidentemente que neste novo cenário há um forte processo de contratação de novos servidores: os professores na rede de EBTT já são metade de todos os servidores (ativos) das centenárias universidades (cerca de 34 mil professores em 2014). Há que considerar ainda que todos os 39 Institutos Federais criados no País estão ainda em fase de implantação, com sua capacidade operacional limitada em torno de metade do previsto. Portanto, para o sucesso da proposta há que se acolher ainda na Rede quase outro tanto de professores. Quanto à qualificação, contrastando com o MS onde mais de 70% são doutores, no EBTT são apenas próximo de 18%. Considerando mestres e doutores, enquanto o MS chega a quase 100%, no EBTT são pouco mais e 50%.


Ora, com uma nova carreira focada com prioridade no regime de dedicação exclusiva e no tripé ensino, pesquisa e extensão, estes dados impuseram uma nova reflexão: quanto tempo seria necessário para que os novos servidores, recém contratados, tivessem a oportunidade de se qualificarem? Qual a capacidade dos Sistema Educacional (CAPES, CNPq e outros órgãos de financiamento da pesquisa) gerar bolsas suficientes para esta demanda? Como liberar os novos docentes, contratados apenas com graduação no forte processo de expansão realizado? Quantos anos mais serão necessários para que esta demanda seja satisfeita? Considerando que em sua grande maioria as novas escolas são formadas com um quadro de docentes novos, como manter as atividades e ao mesmo tempo liberar estes docentes para qualificação?


Assim, o Reconhecimento de Saberes e Competências que surgiu como uma alternativa para corrigir uma injustiça – a ausência de condições e incentivos para os professores se qualificassem – revelou-se como alternativa para que esta injustiça não continuasse sendo perpetrada contra os jovens professores que estavam entrando na Rede Federal de EBTT. Mais do que isto, pautou uma nova necessidade: passou a ser o motor a impulsionar a exigência de um Plano de Capacitação por parte do Ministério da Educação e das Reitorias dos Institutos Federais. Enquanto isto não se viabiliza, o RSC poderia ser a alavanca incentivadora para que os docentes tenham seu trabalho valorizado, além de ajudar nas condições para que outras alternativas de qualificação sejam buscadas pelos próprios professores (matrículas em cursos de mestrado e doutorados na rede privada, com recursos do RSC).


Quais os riscos da proposta? Não foram ignorados! Os críticos da proposta disseram que traria uma “mediocrização” da carreira do EBTT. Os adeptos da meritocracia não admitiam o fato de que os mestrados e doutorados acadêmicos extremamente exigentes pudessem ser equiparados a um “reconhecimento de saberes. Diga-se, equiparação que de fato não existe e revela apenas desconhecimento da proposta. Alguns pretensos sindicalistas acusaram a proposta de ser “politiqueira” e que seria utilizada como “moeda de troca dos gestores”; característica de uma esquerda retrógrada, identificaram na proposta um processo “produtivista de avaliação do trabalho docente”.


A proposta do RSC supera todas estas possíveis negatividades. A proposta é um dos itens da Cláusula Nona o Termo de Acordo 02/2012 que criou o GT-Docentes no âmbito do Ministério da Educação. Num trabalho inteligente e responsável, o GT-Docentes – formado pelo PROIFES-Federação, o governo (MEC e MPOG), o Conif e a Andifes4 – desenvolveu uma proposta muito responsável e coerente que garante uma forte conquista para os professores e para o sistema educacional brasileiro. Proposta que foi depois referendada pelo Conselho Permanente de Reconhecimento de Saberes e Competências (CPRSC), previsto da Lei 12.772/2012 que resultou do referido Termo de Acordo.


A crítica de “mediocrização” da carreira não se sustenta na medida em que o RSC é um incentivo que não se equipara a título (Art. 5º da Resolução 1, do CPRSC). Além disso, só poderá requisitar o reconhecimento o professor que possuir o título específico imediatamente anterior. Ou seja, para requisitar o RSC II (direito a receber a RT de mestre) o docente obrigatoriamente deverá apresentar o título de especialista e para pleitear o RSC III (direito a receber a RT de doutor) deverá apresentar obrigatoriamente o título de mestre. Assim, o RSC tornou-se um incentivo à qualificação da Rede, preocupação definida explicitamente na legislação.5


O RSC tem em sua concepção a ideia de ser um instrumento de valorização dos professores de EBTT. Isto porque não deve ter um caráter de substituição à titulação acadêmica, sendo fundamental que se mantenha na Carreira de EBTT o estímulo à obtenção pelos professores dos títulos de especialização, mestrado (acadêmico ou profissional) e doutorado. Além disso, na medida em que pauta cotidianamente a ausência de titulação, coloca para as autoridades responsáveis (governo e gestores) a necessidade de criação de programas de mestrado e doutorado voltados para a Rede profissional, com características próprias, voltadas para a aplicação do conhecimento e da tecnologia.


Respeitando as diversas realidades do Brasil, as diretrizes para o RSC (21 diretrizes, Art. 11 da Resolução 1) foram definidas de forma bastante geral, de sorte que caberá aos Conselhos Superiores das Universidades e dos Institutos Federais fazer a normatização específica, garantindo de forma intransigente a autonomia das Universidades e Institutos Federais. Foi tomado muito cuidado ao elaborar a diretrizes de maneira que pudessem ser aplicadas para todos os professores da Carreira de EBTT: os que atuam nos IFs e ETs (Escolas Técnicas vinculadas às Universidades); os que atuam nas Escolas vinculadas de Educação Básica e de Educação Infantil, assim como os professores das escolas militares.


A reflexão sobre o tema não é definitiva. Mas, não há mais como negar de que se trata de um forte incentivo para os professores do EBTT. Os que criticaram a proposta com genuína preocupação e lealdade intelectual entenderam que da forma proposta e regulamentada o RSC representa um importante incentivo à permanência na educação profissional e motor para potencializar a qualificação. Aqueles que foram contra porque são sempre do contra, porque não tiveram a competência para entender que era uma demanda legítima dos professores, mudaram o discurso, produziram textos, reapresentaram propostas já debatidas e aprovadas no GT-Docentes e se apresentam como defensores da proposta como se não tivessem deliberação de “lideranças” contra o RSC. Embora não seja com a desejável humildade que se esperaria de um educador, que bom que assim referendam o trabalho realizado pelo PROIFES-Federação.


Há ainda que avançar na proposta: na forma pensada e aprovada o RSC deveria ser também um direito para os professores aposentados. Esta proposta foi apresentada pelo PROIFES-Federação no GT-Docentes mas não obteve o apoio dos demais. A razão que motivam a defesa parece óbvia: tendo em sua motivação precípua corrigir a injustiça praticada ao longo dos anos, garantiu-se que “A apresentação de atividades para obtenção do RSC independe do tempo em que as mesmas foram realizadas” (Art. 7º). Além disso, garantiu-se mecanismos diferenciados para que professores mais antigos pudessem ter acesso ao benefício. Para isto ficou definido que (§ 6º do Art. 12) “Na ausência de documentação comprobatória, para o período anterior a 1º de março de 2003, será facultado a apresentação de memorial, que deverá conter a descrição detalhada da trajetória acadêmica, profissional e intelectual do candidato ao RSC, ressaltando cada etapa de sua experiência”. Ou seja, os professores aposentados podem cumprir todos os requisitos previstos para a obtenção do RSC.

A representação sindical continua atenta e atuante para defender os direitos de todos os professores. Participamos do Conselho Permanente de Reconhecimento de Saberes e Competências, órgão criado para acompanhar a concessão do RSC. Cabe agora às representações locais, no âmbito da autonomia de cada instituição, definirem as prioridades de suas respectivas instituições e aprovarem no Conselho Superior suas Resoluções para garantir este importante direito.

REFERÊNCIAS:
Termo de acordo 02/2012
Disponível em : chrome-extension://efaidnbmnnnibpcajpcglclefindmkaj/https://proifes.org.br/wp-content/uploads/2024/05/termo_de_acordo-02_2012.pdf

Termo de Acordo 19/2015
Disponível em: chrome-extension://efaidnbmnnnibpcajpcglclefindmkaj/https://proifes.org.br/wp-content/uploads/2023/02/Termo-de-Acordo-19_2015.pdf

Lei 11.894/2008
https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2008/lei/l11892.htm

Lei 12.772/2012
Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2012/lei/l12772.htm
Portaria MEC de Regulamentação do RSC

Portaria MEC de Criação do CPRSC
Disponível em: http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_docman&view=download&alias=15837-portaria-491-2013-rsc-pdf&category_slug=junho-2014-pdf&Itemid=30192

CASTIONI, Remi; MORAES, Gustavo Henrique; PASSADES, Denise Bianca Maduro Silva. A educação profissional na agenda do Lulismo: visibilidade e limitações de interesses corporativos. Temáticas, Campinas, SP, v. 27, n. 53, p. 105-138, fev./jun. 2019. DOI: 10.20396/tematicas.v27i53.11604.

MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO (MEC). Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica. Políticas públicas para a educação profissional e tecnológica. Brasília, 2004.
Disponível em: http://portal.mec.gov.br/setec/arquivos/pdf/p_publicas.pdf

BRASIL. MEC/SETEC. Instituto Federal de Ciência e Tecnologia. Um novo Modelo em Educação Profissional e tecnológica. Concepção e Diretrizes. Brasília: MEC, 2010. http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_docman&view=download&alias=6691-if-concepcaoediretrizes&category_slug=setembro-2010-pdf&Itemid=30192http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_docman&view=download&alias=6691-if-concepcaoediretrizes&category_slug=setembro-2010-pdf&Itemid=30192 . Disponível em: 07/08/2021.

http://redefederal.mec.gov.br/expansao-da-rede-federal. Disponível em 25/03/2016

Notas:

  1. A Lei nº 12.772/2012 expressa o que foi assinado pelo governo federal em mesa de negociação com a Federação de Sindicatos de Professores e Professoras de Instituições de Ensino Superior e de Ensino Básico Técnico e Tecnológico – PROIFES-Federação. ↩︎
  2. http://redefederal.mec.gov.br/expansao-da-rede-federal. Disponível em 25/03/2015.
    ↩︎
  3. Definições da Lei 11.892/2008, Art. 2º e parágrafos ↩︎
  4. Em cumprimento dos itens do Termo de Acordo 02/2012 foi criado o GT-Docentes no âmbito do Ministério da Educação ↩︎
  5. Art. 4º da referida Resolução: “O RSC não deve ser estimulado em substituição à obtenção de títulos de pós-graduação (especialização, mestrado e doutorado)”. ↩︎

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