Em 1932, o Brasil deu um importante passo na luta pela igualdade de direitos, ao conceder às mulheres o direito de votar. Essa conquista foi resultado de intensas mobilizações de mulheres como Celina Guimarães, de Mossoró, primeira brasileira a votar.
Esse marco histórico abriu portas, mas o caminho para a representatividade plena na política ainda é longo. Para refletir sobre esse percurso e os desafios atuais, entrevistamos Kênia Maia, professora do Departamento de Comunicação Social da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), pesquisadora de violência política de gênero e ex-presidenta do ADURN-Sindicato (2006-2008).
Kênia relembra o impacto inicial da conquista do voto feminino: “Em 1932, as mulheres brasileiras passaram a ter o direito ao voto. Essa conquista foi o resultado de muita luta, não foi o presidente que foi lá e assinou. Foi o resultado de mobilização de muitas mulheres, e foi o primeiro de várias outras conquistas.”
Apesar das vitórias, Kênia enfatiza que apenas o direito ao voto não foi suficiente para garantir presença feminina nas esferas de poder, destacando a criação das cotas eleitorais e o direcionamento de recursos financeiros para campanhas femininas, embora os resultados ainda sejam limitados: as mulheres ocupam em média, considerando os municípios, os estados e o plano federal, apenas 18% dos cargos eletivos.
Ao discutir os desafios que as mulheres enfrentam no ambiente político, Kênia aponta o peso de uma sociedade ainda patriarcal e misógina, que cria barreiras invisíveis e visíveis contra a presença feminina em cargos eletivos: “A presença da mulher nos cargos eletivos é o resultado de uma sociedade patriarcal, misógina, que não aceita, que tem muita dificuldade de ver mulheres em espaços de poder. Basta ver os xingamentos que as mulheres, tanto candidatas quanto eleitas, recebem, os tipos de violência.”
Segundo a professora, países vizinhos, como México e Bolívia, adotam leis que garantem a paridade de gênero, algo que o Brasil ainda não implementou. Para ela, o Brasil deve seguir o exemplo de outras nações latino-americanas que já discutem a paridade: “Cotas foi o primeiro passo, mas os outros países estão já discutindo paridade, equidade, que a lei garanta a presença nas listas eleitorais de 50% de mulheres e a eleição de 50% de mulheres.”
Além disso, ela ressalta a importância de combater a violência política de gênero como um elemento crucial para uma representatividade mais justa.
No ambiente político, o machismo se manifesta de diversas formas, muitas vezes sutilmente, como explica Kênia: “O machismo se manifesta na política de forma às vezes muito sutil, como quando uma deputada, uma vereadora, uma senadora eleita vai dar uma entrevista e perguntam para ela sobre suas pautas ‘de mulher’, como se ela estivesse confinada a certos assuntos.”
Apesar das dificuldades, a presença feminina nas câmaras legislativas tem gerado impactos positivos, especialmente em pautas que tratam dos direitos das mulheres e da igualdade de gênero. Como exemplo, a criação lei da dignidade menstrual, a distribuição de absorventes e a criação de procuradorias das mulheres em casas legislativas refletem essa mudança.
Porém a questão racial e étnica ainda é uma barreira. “Se hoje, nos espaços de poder no brasil, temos poucas mulheres, ao considerarmos outros marcadores como raça e etnia, esses espaços são ainda mais excludentes”, reflete a docente.
Por fim, a professora do Departamento de Comunicação Social, Kênia Maia, defende que as cotas devem também refletir a diversidade da população brasileira. “A gente tem que fazer com que a sociedade, os nossos legisladores entendam que é preciso garantir a presença de que quem nos representa seja representativo da sociedade brasileira. E hoje não é! Hoje nos espaços de poder nós temos ainda predominado por homens, e brancos. Isso não é a nossa população. Nós precisamos ainda ampliar esse espaço dos negros, das negras, dos indígenas e das indígenas”, pontua Kênia.
Fonte: Adurn