Jailson Alves – Professor da UFBA e diretor de comunicação do PROIFES-Federação
Travestida de modernização do Estado, as mais diversas Reformas Administrativas vêm sendo trazidas para ser implementadas há muito tempo. Quem acompanha a política sabe que recorrem a esse expediente, com argumentos falaciosos, escondendo o principal objetivo que é atacar as políticas que atendem às pessoas de menor faixa de renda e que dependem do Estado para a efetivação do que preconiza a Constituição Federal na atenção à saúde, educação e demais programas sociais de cidadania e de transferência de renda.
Há, no discurso ideológico dos políticos de direita e extrema-direita no Brasil, propagado pelos meios de comunicação de massa, a ideia de que temos um Estado inchado, comparado, na década de 1970 a 1990, a um elefante grande e lento. Trazia, e traz ainda hoje, a ideia de que os servidores públicos comprometem o desempenho econômico do país. A eficácia da propaganda chega a tal ponto que até mesmo aqueles que necessitam de políticas públicas educacionais (creche, escola e universidades), de saúde (postos de saúde, UPAs, policlínicas e hospitais), ou aqueles que almejam um posto no serviço público (professor, médico, engenheiros, advogados e outros), acabam por serem contra às suas próprias necessidades da presença do Estado.
Para efeito de análise, trazendo a verdade dos fatos, o Brasil possui cerca de 12,7 milhões de funcionários públicos. Esse número corresponde a aproximadamente 12,4% dos trabalhadores do país, que é cerca de 103 milhões de trabalhadores, entre o setor público e o setor privado. Esse total de servidores públicos é considerado pequeno quando comparado à média dos países que fazem parte da comunidade da OCDE – Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico*, que é de 23,48%.
O Brasil precisa, de fato, de uma modernização na prestação de serviço à sociedade. Mas será que é esse o interesse defendido pelos políticos de direita e extrema-direita, em conluio com os meios de comunicação de massa? Será que é a quantidade de servidores públicos que tem atrapalhado essa tal modernização e atendimento de qualidade ao que acessam os serviços?
O Brasil gasta 13,5% do PIB com servidores públicos. No entanto, quando comparamos a média salarial dos servidores públicos do Brasil com relação aos países desenvolvidos, o resultado é: o Brasil tem uma das piores rendas médias entre os servidores públicos. Há distorções, sim, e precisam ser corrigidas, mas essa distorção está praticamente confinada ao Poder Judiciário, cujos salários ficam em torno de 30 mil reais. No Poder Executivo, onde a maioria absoluta dos servidores que atendem à população está, o salário médio é baixo e pouco atrativo, especialmente entre os que têm apenas o ensino médio.
Sendo assim, o que o discurso da Reforma Administrativa esconde? O que está mesmo em jogo? O que sempre esteve presente no Brasil, desde sua invasão: interesses privados e de grupos minoritários (mas fortes econômica e politicamente) contra o interesse e a necessidade da maioria da população.
Estamos falando em centenas de bilhões de reais, que são movimentados nas esferas federal, estadual e municipal para oferta de serviços como educação, saúde, transporte, energia, água, cultura e lazer, todos necessários ao desenvolvimento tanto individual como coletivo de qualquer sociedade. A creche e a escola do seu bairro, as UPAs, os hospitais, os ônibus que circulam na sua cidade, os parques, enfim, toda a infraestrutura de prestação de serviços à população dependem de serviços públicos de qualidade, que, por sua vez, são executados por servidores/as públicos, com investimento que deve ser público, já que a maioria da população precisa ter essa assistência do Estado.
Na real, o que temos mesmo é a necessidade de aumentar a oferta de serviços e contratação de servidores para atender a quem precisa, como, por exemplo, alguém que vai a uma UPA para se vacinar ou para atendimento de emergência. Se não há investimento do Estado, com o consequente desmonte dos serviços ofertados, esses mesmos serviços serão ofertados por empresas privadas, com preços elevados, geralmente com qualidade e controle inferior, e que sacrificam ainda mais a renda das famílias.
Como podemos enfrentar essa reforma que, como já foi dito, mais parece uma demolição do Estado, abrindo caminho para mais enriquecimento de grupos pequenos, em detrimento do empobrecimento da população?
A resposta é: exigindo que a aplicação dos nossos impostos em serviços públicos seja adequada, cobrando do Poder Legislativo a fiscalização da prestação de serviços públicos de acordo com a demanda da população e elegendo representantes que estejam comprometidos com o desenvolvimento do país, e não com o enriquecimento de grupos já abastados. Enfim, não se engane: a Reforma Administrativa não é boa nem pro Brasil nem pra você, ela atende a empresários que agem como aves de rapina das finanças públicas do nosso país.
*38 países compõem a OCDE, incluindo a maioria das economias desenvolvidas da Europa e da América do Norte, além de países na Ásia, América Latina e Oceânia, como Alemanha, Austrália, Canadá, Chile, Coreia do Sul, Estados Unidos, França, Japão, México, Nova Zelândia, Portugal, entre outros.