Por Romualdo Pessoa
O dia 31 de março de 1964 inaugurou um período sombrio e nefasto da história brasileira. Naquela terça-feira, militares se deslocaram de Minas Gerais para o Rio de Janeiro, com tropas comandadas pelo general Olímpio Mourão Filho, e em 1º de abril deram início a deposição do presidente João Goularte do governo legítimo brasileiro. Com o apoio de setores do empresariado e da ala mais conservadora da sociedade, se instalaram no Palácio do Planalto. De lá só saíram após 21 anos, depois de muitas violências cometidas contra quem ousou lutar e resistir, subjugando, a partir daí, o povo brasileiro, a uma ditadura cruel.
Era tempo de Guerra Fria, Estados Unidos e União Soviética disputavam palmo a palmo sua influência no mundo. Nesse contexto, os estadunidenses não pestanejaram em apoiar e financiar golpes militares em toda a América Latina, e o Brasil não ficou de fora. Com apoio financeiro e logístico do governo dos EUA, a ditadura militar afundou nosso país nas trevas da censura, da tortura, do exílio, da morte, dos desaparecimentos e da mentira.
Felizmente, nosso país conseguiu superar esse martírio e perversão militar. No dia 15 de março, completamos 40 anos de democracia ininterrupta, algo inédito na nossa história. Mas esse caminho não foi tranquilo. Muitos solavancos e retrocessos marcaram essas quatro décadas.
Nova tentativa
A ascensão de Bolsonaro ao poder em 2018, sem sombra de dúvidas, foi um desses revezes. Ele teve o caminho pavimentado pelo impeachment ilegal, considerado por analistas como um golpe parlamentar-judicial, que destituiu Dilma Rousseff e possibilitou a ascensão da extrema-direita ao Poder. Militar reformado e saudoso dos anos de chumbo, Bolsonaro subiu a rampa junto com militares,saudosistas da ditadura, negacionistas da ciência e das mudanças climáticas, fanáticos religiosos, neo-nazistas e fascistas.
Bolsonaro nunca escondeu sua vocação golpista, muito pelo contrário. Em diversos momentos atacou a democracia abertamente. Em outros, tramou contra ela por debaixo dos panos, esquema que foi revelado e que o tornou réu por tentativa de golpe de estado na última quarta-feira (26).
Sua tentativa de permanecer no poder à força envolveu militares do alto comando e desaguou nos ataques de 8 de janeiro. Naquele momento, o estado democrático de direito ficou por um fio. Não fosse a rápida resposta do Estado brasileiro, poderíamos estar em um cenário bastante diferente hoje.
Agora, Bolsonaro está no banco dos réus. As instituições republicanas brasileiras, até o momento, têm mostrado que não tolerarão novos arroubos golpistas. Enquanto seu filho e aliados políticos viajam para os EUA em busca de apoio internacional para que ele consiga voltar ao poder, Bolsonaro repete o mantra da “anistia para pacificar o país”.
Vivemos um momento complexo no nosso país, como em outros períodos históricos. Se fraquejarmos, podemos dar sobrevida a uma sanha golpista que não mede esforços para voltar ao Poder e lá permanecer, fomentando o horror repressivo ditatorial. Precisamos reforçar junto ao povo brasileiro o sentimento de “nojo da ditadura”, tal qual expressou Ulysses Guimarães quando promulgou a Constituição democrática em 1988. E mostrar a todos aqueles que tramam contra o Brasil que os 40 anos de democracia nos fortaleceram.
Não podemos nos esquecer de 31 de março e do 1º de abril de 1964. A ditadura militar levou vidas de lutadores e lutadoras que defendiam a democracia. A lição que deve permanecer é que o preço pela falta da democracia é pago com vidas, subjugação, repressão, falta de liberdades políticas e muita desigualdade social.
Está na hora de superarmos essa sombra golpista, para que possamos vislumbrar uma sociedade mais justa socialmente e um futuro democrático e soberano.
Romualdo Pessoa é professor da Universidade Federal de Goiás (UFG), Historiador, Doutor em Geopolítica e Diretor Financeiro do Adufg-Sindicato
Fonte: ADUFG Sindicato