“Não há educação superior de qualidade sem trabalho decente para quem dedica a sua vida à universidade” afirma Diretora do PROIFES durante CRES+5

Na manhã desta quinta-feira (14) as condições de trabalho na educação superior foram debatidas durante a Conferência Regional de Educação Superior (CRES+5) no eixo temático 7, coordenado por Marcelo di Stefano (CONTUA). Na ocasião, a Diretora de Relações Sindicais e Internacionais do PROIFES-Federação, Ana Boff de Godoy foi debatedora da mesa representando a Federação e dando voz a milhares de docentes que vêm sofrendo com a desvalorização da carreira nos últimos anos. Participaram também da mesa Raquel Dias e Cristina del Papa. O eixo afirma como princípio de que é impossível haver educação superior de qualidade sem assegurar os direitos e as condições laborais estabelecidos pela Organização Internacional do Trabalho, como emprego produtivo com salário justo, oportunidades e tratamento igualitário, seguridade social e possibilidades de desenvolvimento pessoal e integração social, entre outros.  Durante sua fala, a representante do PROIFES defendeu a importância da educação pública brasileira em todas as esferas da sociedade, apontou as principais causas de adoecimento dos docentes, alertou sobre as perdas salariais e encaminhou propostas de prioridade e de ações concretas, para que em 2028, ano da próxima CRES, se discuta questões mais refinadas e não de ordem tão básica. “Sem a educação pública brasileira não há sequer pesquisa, pois são as universidades públicas as responsáveis por mais de 90% da pesquisa feita nesse país” afirmou Ana Godoy  no início da sua participação apontando uma das causas principais do adoecimento dos docentes, o acúmulo de funções. Um outro alerta foi referente ao crescimento dos casos de assédio e de violência por parte dos estudantes, ocupando o Brasil o primeiro lugar no ranking da violência contra professores.  Perda salarial A perda salarial sofrida pelos professores e professoras do magistério superior também foi destaque durante a participação do PROIFES na Conferência. Ana Godoy relembrou que a última negociação salarial aconteceu em 2015 e que de lá até o final do último governo a categoria foi ignorada e tripudiada. “Em 2023 recebemos, juntamente com todos os servidores públicos, 9% de recomposição. Neste ano, porém, diferentemente do que esperávamos, as negociações não avançam. O reajuste é zero, nos diz o governo, dando um aceno de 4,5% em 2025 e 4,5% em 2025, com reajuste zero, chegaremos em janeiro de 2025 com 40,3%”, alertou Ana. “Como então, nesse cenário, ter um trabalho docente decente? Trabalho decente pressupõe condições salariais justas e dignas, segurança e dignidade humana, liberdade no exercício da profissão, desenvolvimento pessoal e pressupõe a participação nas instâncias de decisão sobre os direitos trabalhistas, o que inclui nossos salários e nossa aposentadoria. E essas não são bandeiras aleatórias, são os princípios definidos pela OIT”, defendeu a professora. Diante dessa situação, um outro alerta foi emitido pelo PROIFES-Federação, nos últimos 6 anos a procura por cursos de licenciatura caiu em 74%, um sinal claro e drástico do quanto a figura docente foi desvalorizada nos últimos tempos e um sinal de que precisamos com urgência reverter a lógica de que “ a carreira docente é a alternativa possível para quem não deu certo em outra área”. Propostas e encaminhamentos Encerrando sua participação no eixo, o PROIFES encaminhou duas propostas de prioridade e de ações concretas para melhorias no trabalho docente. A primeira diz respeito à necessidade de mais estudos sobre as condições de trabalho dos professores e professoras e sobre o impacto que essas condições causam na saúde física e mental. Uma tarefa que precisa ser levada a sério pelos sindicatos, federações e pelas próprias universidades. E em segundo lugar, a categoria precisa ser verdadeiramente vista e respeitada. “E isso não passa só por um respeito protocolar, como o de termos nossa classe reconhecida e aplaudida e nossas entidades de classe reconhecidas e incluídas nas decisões que dizem respeito à classe mesma, mas também no âmbito do trabalho docente propriamente dito, com um olhar no mínimo, mais respeitoso sobre as nossas condições de vida digna, o que passa em primeira instância pela nossa recomposição salarial e valorização da carreira”, finalizou Ana Godoy.

Seis anos após assassinato, instituto mantém legado de Marielle vivo

Após a noite de 14 de março de 2018, a família da vereadora assassinada Marielle Franco se viu envolvida por uma junção de sentimentos: a dor, o luto, a indignação que – até hoje – serve como combustível para a busca por justiça, e a necessidade de não deixar morrer a luta da ativista por uma sociedade melhor. A comoção causada pelos assassinatos de Marielle e do motorista Anderson Gomes, por si só, potencializou em todo o país o nome da carioca negra, bissexual e criada na favela da Maré. Mas era preciso institucionalizar toda a comoção e os sentimentos vivenciados pela família de Marielle. Assim nasceu o Instituto Marielle Franco. “O instituto traz esse resgate da história. A resposta tem que ser dada para mim, enquanto mãe e para a família. O mundo inteiro quer saber quem e por que mandaram matar Marielle”, disse à Agência Brasil Marinete da Silva, mãe da vereadora e conselheira fundadora do Instituto Marielle Franco. “Quem mandou matar Marielle mal podia imaginar que ela era semente, e que milhões de marielles em todo mundo se levantariam no dia seguinte”, diz o instituto em seu site. A organização da sociedade civil é financiada por meio de patrocinadores e também recebe doações de pessoas físicas. As principais atuações são a cobrança por justiça, a defesa da memória de Marielle – tão atacada por notícias falsas, e a personificação do legado político, atraindo e estimulando novas lideranças periféricas, principalmente mulheres negras e faveladas. “É esse o papel do instituto, trazer essa mulher para essa centralidade, dizer o quanto é importante ocupar. A mulher tem que estar onde ela quiser, e a Marielle traz isso, com esse recorte da periferia”, explica Marinete. Inspiração Até 2022, o Instituto Marielle foi dirigido pela irmã da vereadora, Anielle Franco. Ao ser nomeada ministra da Igualdade Racial do governo Lula, em 2023, o cargo foi ocupado por Lígia Batista. A também mulher negra e periférica conhecia Marielle desde antes de ela se tornar vereadora. A defesa dos direitos humanos foi o que uniu as duas. Lígia trabalhava com o tema na organização não governamental (ONG) Anistia Internacional Brasil. “Ver Marielle falar para as pessoas, como ela conseguia romper bolhas, conseguia comunicar as suas causas foi algo definitivamente muito inspirador pra mim. Sou muito feliz por ter tido a oportunidade de conhecer a Mari ainda em vida”, conta Lígia. Lígia crê que ao defender a memória e semear os ideais de Marielle, o instituto consegue mudar realidades no país. “A gente acredita na possibilidade de criar futuros para que pessoas como Marielle possam não só acessar, mas também permanecer em espaços de poder e tomada de decisão e, efetivamente, conseguir transformar a nossa democracia e, de fato, seguir lutando por justiça, dignidade e bem viver para todo mundo”. O instituto é um catalisador de ações como cursos de formação em direitos humanos, organização de seminários e proposição de articulação entre outras organizações da sociedade civil e coletivos, notadamente de populações periféricas e minorias representativas, como negros e a comunidade LGBTQIA+. “É fundamental poder inspirar as novas gerações a entender como nossa vida é atravessada pelas desigualdades de gênero, de raça, de classe, mas também se entender enquanto um ator protagonista nesse processo, porque a gente sabe que as estruturas políticas não têm servido aos nossos propósitos de vida. Então é fundamental a gente seguir inspirando, fortalecendo, formando novas gerações de lideranças políticas para que elas consigam, junto com a gente, transformar essas estruturas de poder”, descreve Lígia à Agência Brasil. Rede de sementes O logotipo do Instituto Marielle é a representação de sementes. Uma simbologia que remete a um dos verbos mais conjugados pela iniciativa: semear, ou seja, criar consciência social em jovens periféricos. Uma integrante da rede de sementes é a professora de cursinho pré-vestibular comunitário Raquel Marte, de Niterói, região metropolitana do Rio de Janeiro. Formada em letras e cursando atualmente produção cultural, foi no instituto que teve mais contato com cursos e articulações em prol da defesa dos direitos humanos. “Eu tive esse tipo de conteúdo na faculdade. Mas boa parte das participantes [da rede de sementes] são pessoas do povo, pessoas de pouca instrução e, por meio do instituto, elas têm acesso também a conhecer os seus direitos de cidadãos. Por meio do acesso a informações corretas é que a gente pode fazer qualquer tipo de mudança na sociedade civil”, diz Raquel, acrescentando que o conhecimento é uma espécie de antídoto para campanhas de desinformação e fake news. Agenda Marielle O instituto busca também ter diálogo com outra ponta do processo político: os representantes eleitos. Por meio da Agenda Marielle – um conjunto de pautas e práticas antirracistas, antiLGBTfóbicas, feministas e populares – há uma busca por articulações que funcionam como uma espécie de cobrança por ações políticas. “Essa relação se dá, fundamentalmente, a partir de uma provocação que a gente faz, tanto para candidaturas, mas também para aquelas que são eleitas, para que se comprometam com as nossas pautas e as nossas práticas. A gente convoca as candidaturas progressistas, candidaturas que se inspiram nesse símbolo de luta que a Marielle se tornou, a assinarem e defenderem essa agenda durante a sua atuação enquanto parlamentares. Acho que esse é um caminho que a gente tem explorado que é bem potente”, conta Lígia. Para o professor de ciência política João Feres, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), o diálogo com parlamentares precisa atingir um maior espectro político para ter mais resultado. “As organizações da sociedade civil têm investido muito nas relações com o Legislativo, atividade muito difícil de executar, mas de suma importância. Os donos do capital têm recursos abundantes para contratar escritórios de lobby que se dedicam a esse trabalho diuturnamente. Já as organizações, para competir, precisam promover a profissionalização dessa atividade, algo que não é barato. A questão é que não basta estreitar contatos com políticos já alinhados, é preciso exercer pressão sobre aqueles que se encontram nas bordas do tema, por assim dizer, isto é, os que não têm interesses